Hoje assinamos a escritura da Casa Oxente. Agora, ela tem “casa própria”, e começa a existir, de papel passado.
É uma segunda-feira, véspera de feriado em Portugal. Lisboa está quente, animada, cheia de gente nas ruas. A cidade respira festa — é semana de Santo Antônio, e o ar parece vibrar com expectativa. No Nordeste do Brasil, junho também é tempo de fogueira, forró, bandeirinha no céu. Há uma coincidência simbólica: enquanto aqui se celebram os santos populares, por lá se celebram os mesmos — com outras cores, outros ritmos, mas a mesma alma de festa.
O momento da assinatura foi menos solene do que se poderia imaginar. Era uma sala moderna, funcional, com advogada, antigos proprietários, corretora e solicitadora em volta da mesa. Todo mundo conversava, ria. Um clima leve, quase cotidiano — como se comprar um espaço para um sonho fosse uma coisa que se faz todas as segundas-feiras. Mas não era uma segunda qualquer. Era o dia em que a Casa Oxente ganhava chão.
Confesso que não pensei em nada específico enquanto assinava. Nenhuma epifania. Mas lembro do primeiro dia em que visitei o espaço. A rua arborizada, o bairro cheio de vida e diversidade, a proximidade com o metro, a sensação de acolhimento. Tinha algo ali, uma energia silenciosa, como se o lugar já estivesse nos esperando.
Ainda não sei como será o primeiro dia com portas abertas. Está tudo muito novo, ainda fresco. Mas sei que essa casa é para quem sonha — e, principalmente, para quem às vezes acredita que não pode sonhar. Para quem a vida empurrou para longe da esperança, para quem precisa de um lugar onde começar de novo ou continuar à sua maneira.
A maior dificuldade até aqui foi justamente trabalhar com arte em tempos difíceis. Mas prefiro lembrar da ajuda que veio — das pequenas demonstrações de afeto, das pessoas que estenderam a mão sem pedir nada em troca. É nelas que eu me concentro. E se eu pudesse escrever uma dedicatória na primeira parede da nova casa, ela seria assim: “Para quem sonha. E para quem precisa sonhar, mas nem sempre teve o direito.”
Hoje, colocamos essa pedra no chão. Uma pedra que tinha o peso de uma BIC. Mas não de uma BIC azul, e sim, de uma daquelas, antigas, com quatro cores. Cores que servem para misturar possibilidades e desenhar o mundo.
by Wilame Lima